Governo Lula bloqueia verba para alfabetização, transporte escolar e bolsas de estudo
A tesourada no Ministério da Educação soma R$ 332 milhões e mexeu em várias ações tocadas pela pasta.

Em uma manobra que tem gerado polêmica e levantado questionamentos sobre as prioridades do governo, a administração do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) bloqueou a liberação de recursos públicos destinados à educação básica, ao programa de alfabetização infantil, transporte escolar e bolsas de estudo. A medida aconteceu na mesma semana em que o governo lançou um ambicioso programa de ensino em tempo integral. A decisão, contudo, desencadeou críticas e cobranças diretas ao ministro da Educação, Camilo Santana (PT).
O impacto financeiro do corte atingiu diretamente o Ministério da Educação, repercutindo em diversas áreas essenciais para a educação. De acordo com análise da Associação Contas Abertas, com base em dados do Sistema Integrado de Planejamento e Orçamento (Siop), o corte totalizou a expressiva quantia de R$ 332 milhões. A parcela mais afetada foi a educação básica, que perdeu R$ 201 milhões, incluindo todo o recurso destinado ao desenvolvimento da alfabetização, totalizando R$ 131 milhões.
Além disso, a decisão teve impacto sobre a aquisição de veículos para o transporte escolar, cuja verba foi reduzida em R$ 1 milhão, bem como sobre bolsas de pesquisa no ensino superior, que sofreram um corte de R$ 50 milhões.
O bloqueio de recursos implica que o dinheiro só será desbloqueado após uma avaliação governamental, que levará em conta a conformidade com o teto de gastos, uma regra fiscal vigente. No entanto, não há previsão de quando essa liberação poderá ocorrer. Esse bloqueio afeta diretamente as escolas, que ficam sem a garantia de receber os repasses orçamentários planejados.
Essa medida, implementada por decreto no último dia 28, ocorreu logo após a sanção do projeto de escola integral pelo presidente Lula, gerando questionamentos sobre a coesão das decisões governamentais. O bloqueio de recursos é uma estratégia para evitar desequilíbrios nas contas públicas, que, se não controlados, podem inclusive levar ao impeachment do presidente. É uma decisão baseada em critérios matemáticos, mas o governo detém o poder de selecionar quais áreas serão mais afetadas quando precisa ajustar suas finanças.
Em resposta às críticas, o secretário-geral da Associação Contas Abertas, Gil Castello Branco, destacou que, embora fosse mais desejável que os cortes recaíssem sobre despesas como passagens aéreas, diárias, locação de imóveis e outros, tais opções podem não gerar o impacto necessário ou ser politicamente inviáveis.
Por sua vez, a decisão do governo de bloquear recursos ocorre em um contexto em que a educação em tempo integral é destacada como uma prioridade do Ministério da Educação. Isso ocorre após a revogação do programa de escolas cívico-militares, que tinha sido um foco anterior. A pasta da educação anunciou a ambiciosa meta de incluir 32 milhões de estudantes no programa até 2026. No entanto, o bloqueio atual de recursos pode comprometer não apenas outros aspectos da educação, mas também a implementação plena do programa de ensino em tempo integral.
A doutora em Direito Constitucional e presidente-executiva do Instituto Articule, Alessandra Gotti, ressalta que a educação está mais uma vez em uma situação de incerteza. Ela argumenta que, para que as metas de alfabetização e educação em tempo integral se concretizem, é crucial que o orçamento seja completamente recomposto e mantido. A incerteza sobre a resolução desse impasse financeiro levanta questionamentos sobre as verdadeiras prioridades do governo no que tange à educação.
Ao ser questionado sobre essa medida, o ministro Camilo Santana, em entrevista ao portal UOL, assegurou que o bloqueio não afetará o programa de ensino integral e manifestou otimismo quanto a um aumento nos recursos destinados à educação em 2024, através da aprovação do arcabouço fiscal. Contudo, não foram fornecidos detalhes sobre como as áreas afetadas pelo bloqueio serão tratadas e como o governo pretende recompor os recursos.
Vale ressaltar que, dentro do corte implementado na educação, o Ministério optou por segurar a liberação de R$ 155 milhões em emendas de bancada. Esses recursos, indicados por parlamentares de um mesmo Estado, têm grande relevância para os políticos envolvidos e são frequentemente negociados com suas bases eleitorais. O bloqueio afeta 15 bancadas estaduais e ocorre em um momento sensível em que o presidente Lula busca estabelecer acordos políticos com o Centrão para obter apoio no Congresso.
O presidente da Comissão de Educação da Câmara, Moses Rodrigues (União-CE), criticou a decisão e anunciou a intenção de convocar o ministro para prestar esclarecimentos. Deputados planejam discutir o assunto na próxima semana. Rodrigues ressaltou a preocupação com os prejuízos que esse corte acarreta para a educação, considerando que o orçamento destinado à área já é considerado mínimo. Ele expressou a expectativa de que os recursos possam ser restabelecidos em breve.
O deputado Luiz Fernando Faria (PSD-MG), coordenador da bancada de Minas Gerais, afirmou que a decisão do governo gera incertezas para as instituições de ensino que aguardam os recursos. No entanto, ele acredita que o dinheiro será liberado até o final do ano. Faria destacou que o governo bloqueou R$ 51 milhões indicados pelo grupo mineiro para institutos e universidades federais no Estado, o que gera insegurança para essas instituições.
Nesse contexto, fica evidente a tensão entre as metas de expansão da educação integral e as restrições orçamentárias impostas pelo governo. A decisão de bloquear recursos destinados à educação básica levanta questionamentos sobre a efetividade das políticas educacionais do governo Lula e sobre qual visão de educação prevalece nas decisões orçamentárias
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